Notoriamente, o ambiente regulatório brasileiro é um dos mais complexos do mundo. O país ocupa as últimas colocações em praticamente todos os rankings internacionais, quando o assunto é a burocracia nacional.

Quase imediatamente associado à ideia de lentidão, o termo “burocracia” remete, por exemplo, ao excesso de documentos exigidos a uma empresa. Entretanto, a burocracia não é algo intrinsecamente negativo. Ela é apenas uma forma particular de organizar o sistema de atividades de um local, de modo que não haja espaço para preconceitos ou paternalismo. Ou seja, é necessário usá-la, mas é vital que seja na dose correta.

Um gargalo no Brasil hoje, é a burocracia para obtenção de licenças para a construção de data centers de diversas instituições: prefeituras, bombeiros, concessionárias de energia e etc. De acordo com alguns profissionais da indústria, a saída seria unificar as exigências de mencionadas instituições em todo país, já que atualmente cada estado tem suas exigências específicas para cada uma dessas instituições.

“A obtenção de aprovações de projetos e licenças/alvarás de funcionamento passa por um processo muito complexo em todos os níveis de governo: Municipal, Estadual e Federal. Além disso, o grau de exigência varia de estado e até mesmo de municípios dentro de um mesmo estado. O prazo médio de aprovação de um projeto, sem muita complexidade, é de 12 meses. Com certeza, a unificação das exigências facilitaria o andamento das análises e aprovações, reduzindo o custo”, avalia Paulo César Resende, CEO da FOX Engenharia.

Em entrevista, o CEO e fundador da empresa brasiliense, realiza um diagnóstico sobre a burocracia no ambiente de negócios de construção de data centers no país e propõe alguns caminhos.

DatacenterDynamics: Mesmo em meio as muitas burocracias e aos grandes problemas logísticos, é fato que o setor de data center brasileiro cresceu muito nos últimos anos e hoje é líder na região. Esse feito foi obtido somente pela grande demanda que o país possui? Que outros fatores podem ser atribuídos a este crescimento?

Paulo Resende: Realmente a grande demanda gerada no país deu visibilidade e estimulou a crescente expansão da indústria de Data Centers e toda a cadeia de produtos que orbita ao seu redor. Além disto, a adoção da Multicloud e as atualizações da rede para suporte à iminente chegada da conectividade no padrão 5G, são, sem dúvida, fatores presentes como impulsionadores a este crescimento.

Também cabe registro que a mudança que vem ocorrendo na tributação incidente em serviços contratados no exterior, aumentando consideravelmente seus custos, torna os serviços oferecidos no Brasil mais competitivos contribuindo para o desenvolvimento do setor a nível nacional.

DCD: O "Custo Brasil", burocracia e a logística são fatores que podem vir a atrapalhar o crescimento da indústria de data center brasileira?

P. R.: O chamado “Custo Brasil” representa aquelas despesas que as empresas de todos os setores entendem que são desnecessárias se os processos e as questões regulatórias que envolvem a cadeia produtiva, bens de consumo e serviços, fossem simplificados.

Pouquíssimas ações foram feitas nos últimos anos para melhorar a infraestrutura, reduzir a burocracia e a insegurança jurídica, principalmente nas áreas civil e trabalhista. Além disso, o despreparo da “Máquina Pública” em cumprir o seu papel de fomentador da Economia, contribui fortemente para “alimentar” ainda mais o chamado “Custo Brasil”.

Sendo assim, a indústria de Data Center como todos os outros setores, continua sendo impactada em seu crescimento/desenvolvimento.

DCD: Por conta da burocracia crescerá a adesão por soluções modulares?

P. R.: Os Data Centers com soluções modulares, contêineres, por exemplo, tem o processo de aprovação mais simplificado, já que não são considerados como área edificada. Entretanto, independente das questões burocráticas, a sua utilização tem algumas limitações sendo indicada para soluções específicas.

DCD: Em relação a burocracia, o que o Governo Federal pode fazer para ajudar na expansão da indústria?

P. R.: Quando criticamos a burocracia que existe no Brasil, não nos referimos às exigências normais que envolvem qualquer processo ou atividade empresarial. Estamos falando do excesso de regras, procedimentos, documentos, certidões e análises que muitas vezes são redundantes, demorados e sem qualquer resultado prático.

Criar marcos regulatórios que facilitem os processos legais e, desta forma, possibilitar que a obtenção das aprovações e licenças seja mais objetiva e célere, com certeza, será um importante passo para estimular os investimentos no setor e consequentemente auxiliar na sua expansão.

Cabe registrar que com relação a contratações públicas na indústria de Data Centers, ações no sentido de aprovarem a nova lei de licitações, que dentre outras atualizações caracteriza a contratação de serviços de engenharia de maior complexidade através de melhor técnica e preço, e não somente pela escolha de quem oferte o menor valor, possibilitará a participação de empresas que empreguem conhecimentos técnicos por excelência na concepção, construção e gerenciamento de Data Centers.

DCD: Até que ponto a FOX acredita que a pandemia atrapalhou o crescimento do mercado de data center brasileiro?

P. R.: Se por um lado a economia estagnou ou mesmo recuou em alguns setores devido à pandemia, as demandas por serviços e soluções de TI aumentaram consideravelmente com o trabalho em Home Office e e-commerce. Atendemos diversos clientes do setor de Data Center neste período. Por isso, não detectamos que o setor tenha sofrido com a pandemia.

DCD: Mão de obra qualificada ainda tem sido um problema para o setor?

P. R.: Sim. A falta de mão de obra qualificada é um grande gargalo no Brasil para o setor de Data Center. No caso da FOX Engenharia que atua na concepção e desenvolvimento de Data Centers o problema se agrava, pois não é fácil encontrar profissionais qualificados.

DCD: Na hora de construir data center as empresas brasileiras ainda são muito tradicionais ou vêm apostando em soluções inovadoras?

P. R.: As empresas brasileiras têm adotado soluções inovadoras na hora de construir os data centers. Porém, observamos que os gestores de Data Center são em geral conservadores.

DCD: É fato que hoje no Brasil, os investimentos em logística são inferiores ao aumento da demanda. Qual é a receita para transpor essa barreira e seguir crescendo?

P. R.: Para se manter o crescimento no setor, sem dúvida que a otimização e atualização dos processos projetuais e construtivos são cada vez mais indispensáveis para suplantar os obstáculos impostos, dentre outros, pela infraestrutura e logística insuficientes.

Neste sentido, a FOX Engenharia tem investido na permanente qualificação técnica de seus colaboradores e na busca por excelência constante nas soluções desenvolvidas e entregues a seus clientes.

DCD: Em termos de construção de data center, o que vem sendo aplicado lá fora que o Brasil precisa adotar?

P. R.: A tendência global nas construções como um todo se mantém pela busca por soluções que gerem menos impactos ao meio ambiente e conduzam a uma maior eficiência energética. Neste sentido é que as experiências no exterior, principalmente de geração alternativa de energia limpa, devem ser mais exploradas e adotadas no Brasil.

DCD: Muito vem se falando em Data Center Verde. As empresas brasileiras realmente vêm investindo em data centers sustentáveis?

P. R.: Como se trata de um mercado globalizado, certificações internacionais são bastante atraentes e incentivadas na concepção dos Data Centers. Neste sentido, selos de sustentabilidade e eficiência energética têm sido demandados e proporcionado investimentos e soluções bastante assertivas. O conceito de Data Center Verde tem estado em soluções presentes nos cinco pilares: virtualização; diagnóstico, gerenciamento e medição; construção e centralização.

As empresas têm utilizado processadores mais eficientes e que dissipam menos calor economizando energia, além da utilização cada vez mais presente de materiais e equipamentos que podem ser reciclados e reutilizados.

Desta forma, os Data Centers Verdes têm sido projetados para terem maior eficiência energética com redução do consumo de energia e menor geração de impactos ao meio ambiente.