O mercado de data centers na América Latina segue atraindo o interesse dos investidores. Mercado esse que tem uma trajetória de crescimento exponencial e só no primeiro semestre de 2022 cresceu mais de 20%, atingindo os 568MW, segundo dados do relatório "Data Center Capital Markets Market Overview H1 2022” da CBRE. “Investidores globais são cada vez mais atraídos pelos retornos ajustados ao risco da região e pelas amplas oportunidades de investimento”, destaca Alison Takano, Líder de CBRE Data Center Capital Markets, América Latina, no estudo mencionado.

O Brasil continua sendo o maior mercado, respondendo por 70% do abastecimento total da região. O país está experimentando um aumento no número de transações relacionadas a edge e à implantação do 5G, "impulsionado por operadoras que fortalecem sua presença em mercados menores".

Além de São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro, os mercados do Sul e Nordeste do Brasil estão atraindo também o interesse de investidores.

Entre outros mercados de data centers de Tier I, o Chile experimentou um crescimento exponencial nos primeiros seis meses de 2022, adicionando 31MW para uma oferta total de 79MW. A Colômbia vem se tornando uma ótima oportunidade para a aquisição de novos terrenos.

O México apresenta escassez de capacidade energética em algumas localidades, mas o município de Querétaro, que está se posicionando como um importante centro de desenvolvimento de data centers no México, é um dos mercados Tier I mais competitivos da América Latina.

Está ocorrendo a saturação de algum território?

Rodrigo Couto, Diretor de Data Center Solutions LATAM da CBRE, prevê um forte crescimento nos próximos 5 anos em vários países, mas “ainda não temos uma tecnologia mais avançada como o 5G para impulsionar o crescimento do mercado e existe uma situação de outsourcing muito grande de serviços”. Ele aponta Argentina, Uruguai e Peru com países em ascensão e indica que “o crescimento do Brasil em 5 anos mais que dobrou e do México um pouco mais que triplicou. Não há saturação local. Todo esse boom atual isso é muito mais por uma demanda que era controlada e agora tem que expandir. Os preços estão subindo, mas a saturação não é uma preocupação no curto prazo”, avalia Couto.

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Como exemplo, a Ascenty revelou à DCD que atualmente analisa a possibilidade de ter outros data centers na Colômbia, onde está construindo seus primeiros data centers em Bogotá, um programado para entrar em operação no quarto trimestre de 2023 e outro para 2024. "Além disso, estamos expandindo no Chile com a construção de um terceiro data center e recentemente inauguramos duas unidades no México. Para o futuro, vemos o Peru como um mercado a ser estudado”, conta Marcos Siqueira, VP de Operações da Ascenty, acrescentando que, "é possível ver um certo desaceleramento no mercado dos centros de dados em países como Estados Unidos e algumas partes da Europa, o que não ocorre na América Latina. Não há e não veremos isso acontecer nos próximos meses. Por conseguinte, continuaremos a expandir para alimentar a demanda local”.

Rodrigo Ulloa, subgerente de Engenharia, Data Center e locais técnicos da GTD Chile, aponta que é o momento de prestar atenção no Uruguai e no Peru, como alguns dos mercados que irão emergir. "Embora o Peru tenha uma boa matriz energética, não há muito investimento nesta área, mesmo assim, a capital Lima terá presença massiva de data centers dentro de alguns anos. Um entrave, é a escassez de terrenos preparados para data centers e a obtenção de licenças é um pouco complicada devido à burocracia".

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Existe um local ideal?

O estabelecimento de um centro de dados no local certo requer uma pesquisa minuciosa para maximizar o investimento. Antes de qualquer coisa, o mais importante é ter a certeza de que existe uma demanda para tais serviços naquela região. Uma vez que exista tal necessidade e que queremos satisfazê-la, precisamos de alguns componentes.

A seleção do local começa com o cliente, com base na procura existente

A seleção do local é um componente crítico de qualquer projeto de construção, mas torna-se ainda mais importante para um centro de dados devido ao papel proeminente que a localização desempenha na influência dos custos operacionais de um centro de dados, bem como da vida útil prevista da instalação.

A primeira coisa é compreender o mercado, a demanda existente e descobrir os potenciais clientes que possam estar nessa área. Analisar como é a concorrência, oferecida por outros centros de dados que se encontram na área e qual é o perfil do cliente daquela localidade.

  • Evitar áreas próximas de aeroportos, estações de serviço, vias férreas próximas ou grandes autoestradas.
  • Evitar áreas com risco de catástrofes naturais. Obter dados meteorológicos ao longo dos últimos dez anos para compreender se existe um histórico de tais incidentes. As catástrofes naturais são um dos maiores riscos potenciais de downtime para os data centers. À medida que os eventos meteorológicos continuam a aumentar de gravidade, evitar locais propensos a estes riscos torna-se uma prioridade ainda maior.
  • Escolher locais de fácil acesso em caso de emergência.
  • Considerar locais onde o resfriamento do ar exterior seja viável, reduzindo assim o custo de operação do data center.
  • Assegurar-se que o local tem área suficiente para estacionamento, armazenamento de água, combustível e acesso a estradas.
  • Avaliar as possibilidades de expansão do edifício.
  • Construir e equipar um data center envolve a movimentação de muitos equipamentos pesados. A condição das estradas próximas pode ser um fator importante para garantir um transporte seguro e eficiente.
  • Lugares com baixo índice de criminalidade.
  • Analisar o custo do terreno, de energia e de redes.
  • Verificar a disponibilidade de incentivos fiscais.

"Outro fator importante é que a localidade seja próxima de uma Cable Landing Station. No Brasil, por exemplo, estamos ligados a todas as estações do país. Procuramos locais com espaço para expansão futura, próximos de rotas terrestres e protegidos de catástrofes naturais características de cada país", conta o VP de Operações da Ascenty.

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Disponibilidade energética agora e no futuro

A energia é a força vital dos data centers, o que gera várias questões: Quais são as minhas necessidades energéticas atuais e futuras? Qual é a robustez da rede? A energia é confiável e de boa qualidade? Até que ponto é acessível a utilização de fontes de energia renováveis?

Os operadores requerem acesso a energia confiável, escalável e acessível. O acesso requer uma compreensão dos serviços públicos locais, suas capacidades e a capacidade de fornecer redundância e proteção contra falhas.

A construção de um centro de dados perto de grandes fontes de energia, tais como barragens hidroelétricas, centrais eléctricas ou parques eólicos, pode minimizar os custos iniciais de construção e reduzir o risco de problemas de transmissão de energia no futuro. A localização da infraestrutura perto de fontes de energia renováveis pode ser imperativa para as organizações que procuram reduzir a sua pegada de carbono. Embora o custo seja uma preocupação fundamental quando se trata de energia de centros de dados, a fiabilidade é igualmente importante.

Rodrigo Couto da CBRE salienta que um dos principais desafios relacionados com a energia é a falta de informações claras. "Com muitos players construindo novos data centers ao mesmo tempo, cria-se uma necessidade de disponibilidade energética muito maior em países que não estão habituados a ter uma quantidade significativa de data centers. Por vezes há projetos em que não temos informação e a disponibilidade de energia no futuro não está muito bem garantida".

Se a capacidade energética for limitada na área, poderão ser necessárias atualizações para apoiar o centro de dados. Embora a capacidade atual possa ser suficiente, os operadores precisam de garantias de que os níveis de serviço serão mantidos se for necessário aumentar a demanda por energia elétrica. Também se deve assegurar que subestações dedicadas para esta finalidade possam ser construídas e operadas.

Cada país da América Latina tem diferentes capacidades no fornecimento de energia, alguns deles têm capacidade de geração, mas, por outro lado, têm limitações de transmissão. Dependendo das necessidades e do calendário das empresas, algumas delas podem enfrentar mais dificuldades.

Miguel Ángel Chávez, country manager da PQC México, assinala que "há data centers que vão ser construídos e esta capacidade vai ser garantida, já outros não têm garantia de que esta capacidade estará disponível nos próximos cinco anos. Este é um grande problema e temos de estar conscientes disso: tanto os designers como os clientes devem ter essa visão de futuro. É essencial prever isto desde a fase de concepção. A procura de eletricidade aumenta a cada dia. É preciso procurar a área ideal que garanta que esta energia estará disponível dentro dos próximos 10 anos. É preciso desenhar com o futuro em mente.”

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"Para saber que capacidade vamos ter daqui a alguns anos, o mais importante é falar com os fornecedores, no caso do México é a CFE, e com base nisso tomar a decisão se é o melhor local ou mudar para outra região onde se tenha essa disponibilidade em curto e longo prazo", avalia Chávez.

Em relação ao custo com energia, cada país tem as suas próprias características. No México, depende do Estado, mas como só há a CFE e não há nenhuma empresa privada que realize o fornecimento, isso torna o serviço mais caro. Não há capacidade para continuar a construir mais linhas de transmissão de energia. Há outros países, como o Brasil que têm diferentes fornecedores e há diferentes investimentos. "Falta ao México mais apoio no setor energético e melhor qualidade no serviço. Outros aspectos como estar perto de uma subestação ou perto de uma central hidroelétrica (mas também pode ser um risco em caso de transbordamento de rios).

"No estado de Querétaro tem havido incentivos. O preço da energia não tem um forte impacto na construção de data centers. Querétaro não tem terremotos, é por isso que eles estão lá, além disso, está perto da Cidade do México e tem baixa latência". Muitos perceberam que Querétaro está bem localizada, mas não é a jóia da coroa, tem de se deslocar para outro lado porque a energia tem um limite e Querétaro está chegando nesse limite. As comunicações avançaram e a baixa latência que se tem em Querétaro pode ter outras cidades vizinhas, como San Luís Potosí, El Bajío, Guanajuato, etc. e tem melhores condições de energia, como explica Miguel Ángel Chávez.

Rodrigo Ulloa, da GTD Chile, explica que existem realidades diferentes dependendo do país. No Brasil, por exemplo, uma empresa pode projetar um data center de 100MW e obter esta energia com relativa rapidez e até construir a sua própria subestação.

"Os hyperscalers normalmente constroem sua própria subestação". No resto dos países, do México ao Chile, as empresas de energia fornecem esta energia onde quer que esta seja solicitada, mas o problema é o tempo e a obtenção de licenças porque há muita burocracia".

Além disso, é importante que estejamos perto de um ponto de abastecimento rápido. "No Peru a energia é mais barata, mas a matriz energética não é tão verde como no Chile. A localização pode fazer o preço variar", conclui Ulloa.

Conectividade

O tráfego de dados está aumentando e as redes de data centers precisam ser constantemente atualizadas para apoiar esse crescimento. Tecnologias bem conhecidas como 5G, IoT, Inteligência Artificial, Big Data, Cloud Computing, Smart Cities e muitas outras estão constantemente desafiando a indústria para melhorar a conectividade. Portanto, ao estabelecer um site, é necessário que o site ofereça conectividade de redes separadas e redundantes, disponibilidade de múltiplos transportadores, infraestrutura de fibra subterrânea, uma rede confiável e que estas redes possam acompanhar as necessidades futuras.

Em última análise, os data centers requerem conexões de rede confiáveis, robustas e escaláveis ao longo do tempo. Todos estes requisitos devem ser considerados no início da concepção das infraestruturas. As necessidades de largura de banda e latência dos data centers individuais variam dependendo do tipo de tráfego que atravessa a rede. Por exemplo, é provável que as aplicações financeiras sejam mais sensíveis às questões de latência do que o alojamento na Web.

Com relação aos principais requisitos de conectividade para um futuro data center, Leonardo Antopia, Chief Commercial Officer da Neutral Networks, salienta que "é preciso que este seja um serviço especializado para data centers, não um serviço inalámbrico ou aéreo. É preciso que seja um fiber to the data center, que tem características diferentes dos de uma empresa de cabeamento". Para além da importância da qualidade do serviço de telecomunicações, o gestor acrescenta que é necessário "alcançar uma alta disponibilidade e isto é conseguido quando se tem uma fibra 100% canalizada, a uma profundidade de 1,80 metros onde os riscos de cortes são minimizados exponencialmente e sempre de ponta a ponta, com a qual se obtêm os melhores resultados de telecomunicações". E considerando a quantidade de aplicações e dados que são transmitidos, torna-se muito sensível ter uma boa qualidade de fibra e configuração de anéis para conseguir redundância".

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Com respeito à situação atual da conectividade na região, Leonardo Antopia concentra-se no México, onde o conceito de neutralidade é um pouco mais avançado, consistindo num transportador que investe no Capex em fibra óptica e infraestruturas de telecomunicações para o disponibilizar a qualquer fornecedor de serviços, quer seja outro transportador ou um data center, o que cria economias de escala.

"A neutralidade faz com que se partilhe a infraestrutura de telecomunicações para não duplicar estes grandes investimentos e para tornar o serviço mais eficiente, sendo o utilizador final o principal beneficiário", diz Antopia.

Embora a conectividade não seja o fator principal na escolha de um local, é um elemento muito importante que acompanha a construção de um data center e é uma das razões pelas quais os data centers são colocados perto uns dos outros porque partilharão informações numa base contínua.

A conectividade submarina é também outro elemento que se deve ter em conta. "O país mais estratégico pode ser aquele que tem mais cabos submarinos. É por isso que há uma corrida para a implantação de cabos submarinos porque é isso que vai ajudar a estabelecer comunicações intercontinentais", diz Wilson Domínguez, Engenheiro Sénior de Operações do Centro de Dados da Claro Chile. Neste caso, ele dá o exemplo da cidade de Valparaíso, que poderia ser um local estratégico devido a conectividade dos cabos ali, no entanto, há um maior consumo de energia. Por isso, o engenheiro da Claro Chile avalia que tudo dependerá do núcleo do negócio. A escolha do local ideal pode ser complexa.

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"O município mexicano de Querétaro seria ideal? De um ponto de vista sísmico pode não ser, mas há um público que precisa do serviço. Apesar do último grande terremoto no México, isso não impede a construção de edifícios. Cada país adapta-se de acordo com as suas condições", argumenta Dominguez.

Talento

Com cada novo projeto de construção de data center anunciado, a escassez de profissionais qualificados no setor torna-se mais aguda. Esta é uma das questões identificadas como prioritárias na agenda da região e da indústria global de data centers. Como refletido no relatório da DCD>Academy's The Future of the Data Centre Professional, as principais formas de transpor esta escassez é a formação dos profissionais em exercício, uma oferta de desenvolvimento profissional estruturada ou a parceria com universidades e faculdades técnicas, entre outras.

"O boom nas infraestruturas dos data centers é uma realidade, não só na Espanha, mas também na América Latina, com o Brasil e o México liderando o caminho. A indústria cresce, mas a concorrência também, o que torna essencial a disponibilidade de profissionais qualificados. A chegada de investimento estrangeiro e a atração de clientes fora das nossas fronteiras exige profissionais que estejam à altura do desafio de um mercado e clientes cada vez mais exigentes", diz Cristina Muñiz, Consultora DCD Academy & CEEDA Certification.

Além disso, ela explica que as empresas estão cada vez mais conscientes desta situação e recorrendo à formação de talentos não só para atrair, mas também para retê-los. "Assim, os acordos com autoridades locais, agências públicas de emprego e universidades estão tornando-se cada vez mais comuns, proporcionando às empresas candidatos com experiência e perfil técnico, que são depois formados em programas de formação mais específicos. Esta tendência é um fato: a DCD>Academy formou mais de 1.800 profissionais em nível global em 2021", destaca Cristina Muñiz.

Ainda sobre a escolha do local para instalação de data centers, é importante que este seja próximo de uma universidade ou escola de formação de TI, o que pode assegurar a disponibilidade de profissionais com qualificações adequadas.

O Instituto Nacional de Estatística e Geografia do México é uma das ferramentas que ajudam neste processo. "Procuramos nos instalar em estados e cidades onde vemos que o desenvolvimento educacional é alto, por exemplo, no México: Guadalajara, Querétaro ou Monterrey, que são as principais cidades e onde existem mais universidades e recursos. Há uma iniciativa para rever as universidades, para ver as características dos engenheiros, com que qualidades terminam os seus estudos e há uma vontade de introduzir um tópico sobre questões relacionadas com infraestrutura de missão crítica que não têm apenas a ver com data centers, mas também com aeroportos, hospitais e hotéis. Isto é útil para os estudantes, pois concluem seus estudos tendo uma ideia de como funcionam as infraestruturas", comenta Miguel Angel Chavez, country manager da PQC México.

Apoio do governo local - Regulamentações

A construção de data centers requer grandes investimentos, mão de obra qualificada e uma elevada utilização de energia, o que é benéfico tanto para as empresas como para a sociedade. Como resultado, a empresa pode qualificar-se e ter direito a incentivos fiscais e/ou de sustentáveis para compensar alguns dos custos substanciais da construção e exploração das infraestruturas.

"Cada país tem as suas próprias iniciativas de contribuição interna, mas depende das políticas governamentais e/ou do investimento privado. Na Venezuela, por exemplo, apesar das condições políticas, os investimentos privados têm sido frequentes, como no caso da Daycohost, uma empresa que recebeu um contrato de um milhão de dólares com a IBM", conta Wilson Domínguez.

É preciso conhecer as partes interessadas locais, pois muitas regiões oferecem reduções em impostos, custos com propriedade ou energia para mostrar interesse em alojar data centers.

Em última análise, a seleção da localização hoje oferece muitas oportunidades, à medida que novos mercados surgem e outros crescem. É certamente um momento emocionante para estar na indústria.