Na.width-880.jpg
Natália Fogaça, Itaú-Unibanco – DCD

"Um mundo de fato igualitário seria aquele em que as mulheres comandassem metade dos países e das empresas, e os homens dirigissem metade dos lares". A frase da executiva de Tecnologia e escritora Sheryl Sandberg é lembrada por Natália Fogaça, Coordenadora de Engenharia de Data Center do Itaú-Unibanco.

De fato, segundo o último relatório da The Tech Talent Charter, há uma alarmante falta de diversidade nos cargos na indústria de tecnologia (apenas 22% dos papéis são ocupados por minorias de gênero). Nos postos de direção, a diversidade de gênero é ainda 6% menor aos cargos na área, de forma geral.

Natália Fogaça trabalha há 13 anos no setor, dos quais sete atuou como líder, e se considera apaixonada pela área. Para ela, a equidade de gênero no mercado de trabalho é uma luta antiga, e embora haja avanços significativos, a situação ainda é longe do ideal.

“As vagas afirmativas são uma iniciativa incrível, mas sozinhas não resolvem o problema. Precisamos tornar o ambiente propício para receber novas mulheres. O mundo ainda enxerga uma mulher energética como mandona. Como fazemos para mudar essa mentalidade? Acredito que o primeiro passo seja trazer luz para esse panorama, refletir e mudar de fato”, explica.

Segundo ela, há poucas mulheres na indústria do Data Center por uma questão cultural, já que as meninas não são tão encorajadas a se interessarem por brincadeiras que remetam à tecnologia. “Tenho uma filha de quase três anos e faço questão que ela interaja com uma diversa gama de brinquedos e atividades, para que no futuro, entenda que pode ser o que quiser. Essa visão deve extrapolar os lares e chegar nas instituições de ensino, encorajando mulheres a se aprofundarem em diversos assuntos, como na tecnologia”, afirma.

“Como líder e como mulher, tenho um papel: a sororidade”

Glaucia Rosalen, CFO da Microsoft Brasil, teve a oportunidade de desenvolver a sua experiência em diferentes áreas da indústria, desde a manufatura de produtos até a venda de serviços, o que lhe deu a possibilidade de explorar o setor sob os mais diferentes ângulos.

color.jpeg
Glaucia Rosalen, Microsoft – Linkedin

"Comecei a minha carreira na IBM. Depois de 11 anos, tive a oportunidade de assumir o primeiro cargo de diretoria, na área de manufatura da Dell. Na sequência, fiz a migração para a Microsoft, onde tenho transitado por diferentes áreas dentro de finanças pelos últimos 10 anos, até assumir o cargo de CFO. Me apaixonei pelo setor, por todas as mudanças que acompanhei em 23 anos, todas as possibilidades que a tecnologia oferece atualmente e como isso empodera cada pessoa e empresa do planeta no sentido de produzirem e fazerem cada vez mais, com menos”, declara Rosalen.

Segundo dados da Brasscom, até 2025, o mercado vai demandar mais 797 mil talentos na área de tecnologia, e como mais de 50% da população brasileira é feminina (segundo o último censo do IBGE), Rosalen afirma que é matemático que para fechar essa conta do número de profissionais demandados para o setor, precisamos incluir todo mundo, sem distinção de gênero.

Para o CFO, o setor de tecnologia vem apresentando mais exemplos de mulheres na liderança e atuação em áreas técnicas para que estas referências inspirem outras mulheres. "Sabemos que o gap de mão de obra feminina em tecnologia ainda é muito grande. Uma das tarefas mais difíceis é romper os preconceitos e estigmas inconscientes que estão intrínsecos na nossa sociedade e criam barreiras de gênero, dificultando que meninas vislumbrem uma carreira nas áreas mais técnicas. Na Microsoft, promovemos vários cursos especificamente para mulheres, para aumentar a representação feminina neste campo", salienta.

Segundo Rosalen, a igualdade em cargos de liderança corporativa é urgente em todos os setores da economia. "Atrair mais mulheres para o setor é importante para sua própria sobrevivência. Sabemos que os índices de participação das minorias não vão ser alterados do dia para a noite. É necessário um esforço permanente e ações genuínas com políticas internas, principalmente de educação das altas lideranças em relação ao tema. A conscientização tem que vir de cima para baixo”.

A CFO da Microsoft acrescenta: "Só agora o homem está percebendo que se ele não trouxer mais mulheres, mais negros e pessoas com deficiência, está limitando a capacidade criativa da empresa e de entender certos públicos que são seus consumidores. A percepção está melhorando, mas é uma jornada.  Como líder e mulher, também tenho um papel: a sororidade. Acredito que nós, mulheres em postos mais altos, precisamos tirar outras mulheres da invisibilidade. É preciso provocar e despertar a ambição de todas e incentivar que se sintam confortáveis em optar pela carreira que tenham mais afinidade”.

Apoio familiar é importante

Vice-presidente de Data Center da Huawei Brasil, Barbara Pizzolatto trabalha no setor de Data Center há 22 anos. "Desde 2005, tenho trabalhado na Infraestrutura de TI como um todo, incluindo centro de dados, soluções elétricas e mecânicas. Fiquei muito honrada quando a Huawei me convidou para este cargo, acreditando no meu trabalho. Há menos de 2% das mulheres no mundo do Data Center. Em posições de liderança, é ainda menos. A Huawei sente a responsabilidade de abrir portas para tantas outras excelentes profissionais que estão neste mercado, lutando por seu espaço".

1672092409524.jfif
Barbara Pizzolatto, Huawei – Linkedin

Para a Pizzolatto, é importante que as mulheres tenham apoio familiar para assumirem posições de liderança. "Não adianta a empresa ter uma vaga, e a mulher não ter o apoio da família ou a segurança para assumir o desafio. Já contratei mulheres maravilhosas que às vezes, ao assumir novas responsabilidades, como viajar ou trabalhar fora do horário de expediente, deixaram o emprego porque o parceiro pede para escolher entre o trabalho ou o casamento", lamentou.

Pizzolatto acrescenta: "Ainda se fala muito em ter que escolher entre ser mãe e executiva. Mas uma mulher pode, sim, ser mãe e executiva. A Huawei incentiva mais mulheres a estarem no mercado, tem programas de treinamento e eventos em torno disso. Mas precisamos que a outra parte, a parte do apoio à família, também seja encorajada”.

Brasil: um dos últimos no ranking

Roberta Galli, gerente de TI da Ascenty, compartilha a mesma paixão pela tecnologia. “O setor une duas coisas que me motivam muito no trabalho: poder interagir com toda a organização e estar em constante contato com o novo em termos de tecnologia. Ver soluções hoje, para o que ontem não era nem um sonho, é fantástico”, destaca.

Galli cita o estudo Global Gender Gap Report 2022, publicado no World Economic Forum, sobre o crescimento nos últimos 5 anos da participação de mulheres em posições de lideranças. “A tecnologia é um setor de destaque positivo, mas quando olhamos a posição do Brasil, há muito a evoluir. Ficamos em 94º no ranking geral formado por 146 países. Nos últimos 5 anos, há praticamente uma estagnação no nosso crescimento, o que é muito preocupante”, lamentou.

Para Galli, é preciso gerar oportunidades, desde a formação até programas internos de equidade. “Felizmente, vemos os grandes players do setor com programas e eventos dedicados a mulheres, o que antes era impensável. E, principalmente, a evolução de grupos de mulheres experientes que têm se dedicado a elevar a representatividade da mulher em tecnologia, como o MCIO, associação de mais de 200 mulheres líderes em tecnologia que se dedicam a promover cursos, mentorias, eventos e vagas no setor”, disse.

Roberta Galli_gerente de TI.jpg
Roberta Galli, Ascenty – Assessoria de imprensa

Ela também concorda que falta incentivo “na base”.Quando entrei no curso de Engenharia de Computação, éramos 15 mulheres num total de mais de 100 alunos. Este número não mudou muito. Ou seja, a mulher precisa ser encorajada a conhecer e, então, percorrer a carreira em tecnologia. O ganho é geral”.

“Cargos de gestão continuam majoritariamente masculinos”

Enrica Souza, Líder de Equipe de TI na DataPrev, se considera bem-sucedida e realizada na carreira de Tecnologia. “Comecei bastante cedo no setor, em 1990. Na época, fiz uma formação de nível médio e consegui um emprego como trainee. Passei por diversos papéis em Tecnologia da Informação, incluindo analista de negócio, analista de requisitos, gerente de projeto e analista de implantação. Atualmente, não atuo diretamente no Data Center da Dataprev, mas tive passagem por esta área onde atuei como gerente”, descreve.

Ela comemora o fato de muitas universidades brasileiras terem programas para incentivar a participação de meninas nas ciências. “Também vejo eventos, painéis ou trilhas que buscam ressaltar a presença feminina, mas não diria que o setor de tecnologia protagoniza muitas iniciativas desse tipo consistentemente. As empresas devem procurar uma distribuição mais equilibrada entre homens e mulheres nos cargos de gestão. Hoje vemos um aumento gradativo de mulheres na TI, porém os cargos de gestão continuam majoritariamente masculinos”, disse.

Enrica Souza - Dataprev.jpg
Enrica Souza, DataPrev

Enrica afirma que dentro da TI, a indústria de Data Center tem ainda menos participação feminina do que outras áreas. “Há poucas lideranças femininas porque há poucas trabalhadoras femininas, tal como ocorre na indústria automotiva, química e metalúrgica.

Ainda hoje, os homens são a maioria em carreiras como engenharia, e acredito que a escola pode aproximar as mulheres destas carreiras através do incentivo à participação em olimpíadas científicas e apresentando grandes nomes femininos das ciências”

Enrica acrescenta: “Falta também receptividade por parte dos homens que trabalham nesse ambiente. Empresas com atuação específica nessa área deveriam criar programas de formação para mulheres e capacitação para tornar o ambiente menos preconceituoso com relação à presença feminina”.

Competentes e lutadoras

Ana Siqueira, gerente de Distribuição da Vertiv Brasil, ressalta que iniciou a sua carreira em 2007, como estagiária em uma grande multinacional. “Conquistei a minha efetivação em 2009 e algumas promoções ainda naquela empresa. Já são quase 16 anos no mercado de Tecnologia e conquistei todos os steps que estabeleci como meta. Tenho muito amor no que faço e gratidão as empresas que abriram as portas e me acolheram, ainda que em um espaço dominado por homens”, disse.

Siquiera acredita que as empresas estão cada vez mais preocupadas com o incremento de mulheres no setor tecnológico. “As companhias têm buscado implementar políticas de paridade de gênero, o que tem se tornado cada vez mais frequente e necessário. Desta forma, conseguem diminuir a desigualdade e aumentar a diversidade. Vale ressaltar que o setor de TI é um dos que mais geram empregos atualmente no país e, por isso é tão importante que cada vez mais as mulheres sejam inseridas”.

Segundo a gerente da Vertiv, uma comunicação clara e frequente sobre diversidade, faz com que as pessoas enxerguem este processo como algo “natural e normal”. “Uma mulher na gerência não pode ser algo espantoso. A competência está no conhecimento adquirido e em nada tem a ver com o gênero. Outras ações importantes são: recrutamento interno, programas de referências e reconhecimentos e principalmente, um programa de recrutamento preparado (a maioria das mulheres já foram questionadas com quem deixariam o filho em caso de contratação)”, destacou.

ANA SIQUEIRA - VERTIV (1).jpg
Ana Siqueira, Vertiv – Vertiv

Jessica García, Diretora de Recursos Humanos para a Vertiv na América Latina, considera “desafiadora” a carreira no setor de tecnologia. “É uma área onde não é suficiente ter conhecimento, requer resiliência, flexibilidade, tomada de decisão eficaz, adaptabilidade e capacidade de trabalhar bem em ambientes exigentes, e muitas vezes com estruturas ambíguas. Embora procuremos cada vez mais mulheres para ingressar neste setor, a realidade é que ele ainda é um ambiente predominantemente masculino”.

A Diretora de Recursos Humanos da Vertiv cita estratégias importantes para a inclusão feminina no mercado. “Entre outras ações, promovemos fóruns, eventos e várias iniciativas para mulheres sobre as oportunidades que podem encontrar neste setor, dando voz para que compartilhem experiências e inspirem a mais mulheres no desenvolvimento das carreiras na tecnologia”.

Ela destaca a necessidade de criar sinergias com escolas de ensino primário, secundário e superior, contribuindo e incentivando a orientação vocacional das meninas. “Para aquelas que decidam estudar uma carreira STEM, gerar oportunidades de treinamento dentro da empresa que permitam acelerar a sua inserção e desenvolvimento profissional”, conclui.

*STEM significa Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática.