Com uma evolução gigantesca nos últimos 10 anos, o mercado brasileiro de data centers é considerado maduro, fato esse impulsionado pelos eventos esportivos que o país sediou, como a Copa do Mundo de 2014 os Jogos Olímpicos de 2016; investimentos empresariais e governamentais em infraestrutura tecnológica fizeram o Brasil, que por algum tempo era um gigante adormecido e vinha se desenvolvendo lentamente no segmento de data center, disparar no setor.

Para Eder Gallardo, Senior Consultant do Uptime Institute, o Brasil tem criado um tremendo expertise e know-how no segmento. O país tem se destacado no surgimento de empresas de projetos, construção e de operações de grande envergadura, trazendo assim, o despontamento da liderança e exportação dos nossos serviços (empresas brasileiras) nestas áreas de atuação, para os outros países da América Latina.

“Podemos dizer que um fenômeno interessante aconteceu aqui, pois mesmo tendo crescido com um pequeno atraso no mercado LATAM, em nível de infraestrutura, nossos prestadores de serviços e construtores têm se tornado cada vez mais habilitados e sido referência na América Latina, puxando o Brasil para frente neste quesito”, destaca ele, que em entrevista exclusiva, fala sobre certificações, avanços, gargalos e as particularidades do mercado brasileiro de data center. Leia, a seguir.

DatacenterDynamics: O Brasil possui muitos data centers Tier III, principalmente na região Sudeste. Mas por que temos poucos ou quase nenhum data center Tier IV?

Eder Gallardo: Estamos avançando, porém, o Tier IV é naturalmente um site de número reduzido em todo o mundo. Alguns fatores explicam a tendência pela escolha em massa pelo Tier III, eu posso citar alguns. É claro que cada companhia tem sua estratégia de negócios e as decisões organizacionais são muito particulares, mas os fatores construtivos e custos são os principais limitantes, já que os benefícios para se ter um Tier III são bem próximos aos de um Tier IV.

Fazendo uma comparação na lista geral de sites certificados no mundo todo, perceberemos esta que não é uma tendência somente no Brasil e na América Latina, mas sim, global. Construtivamente, é mais complexo se fazer uma transformação de uma construção existente em um site Tier IV do que em um Tier III, o que acaba atraindo os investidores para o segundo tipo de projeto, já que com esta configuração, se pode obter a redundância e a manutenção concorrente, trazendo a segurança e disponibilidade que a carga de TI necessita para atender à demanda de seus clientes finais, e como sempre, o que determina esta demanda são os usuários finais, sejam eles internos ou externos.

DCD: Quais empresas de Colocation no país você destaca e por quê?

E. G.: Muitas empresas brasileiras têm se destacado no mercado brasileiro e no exterior, isso porque têm buscado a excelência desde a sua fase de design até sua fase de construção de seus facilities, sempre preocupados em certificar seus data centers. Isto pode ser comprovado sobre a qualidade das instalações e o destaque que uma empresa de Colocation recebe após aplicar todos os princípios do Tier Standard Uptime Institute Topology em seu Design e Construção e receber o status de certificada. Além disso as operações de um site certificado em Sustentabilidade Operacional ganha destaque perante a concorrência pela segurança que traz à carga que, além de contar com a redundância física da instalação, garantida pela certificação TCDD e TCCF, terá comprovado, com a certificação TCOS, que seus comportamentos operacionais estão à altura do nível de disponibilidade desta instalação, podendo manuseá-la e operar com excelência a infraestrutura do site.

Isso porque não é apenas um selo publicado no site do Uptime Institute ou no próprio site da empresa, mas sim, muitos benefícios têm sido testemunhados pelos proprietários, incluindo os muitos resultados positivos obtidos nas operações durante o período mais crônico que passamos no último ano da pandemia. As empresas brasileiras de destaque no setor de Colocation, podem ser encontradas no site do Uptime Institute com a lista de certificados Tier:

Lá, é possível filtrarmos por país e podemos ver em destaque empresas brasileiras de Colocation, que estão fazendo a diferença no mercado.

Para destacarem-se as empresas devem oferecer qualidade e segurança às cargas de TI, o que significa: disponibilidade e estabilidade para os novos tempos da nova demanda.

DCD: As empresas brasileiras vêm investindo em certificação para seus data centers? Qual é o tamanho da demanda hoje no país?

E. G.: Sim, hoje há grande demanda pela certificação Uptime Institute, tanto as certificações de projetos – TCDD - Tier Certification of Data Center Design Documents; de Construção – TCCF - Tier Certification of Constructed Data Center Facility; como também as certificações de sustentabilidade operacional – TCOS - Tier Certification of Data Center Operational Sustainability. Os últimos acontecimentos mundiais enfrentados nos últimos anos 2020-2021 trouxeram lições valiosas e muitas organizações brasileiras aceleraram, assim como o mundo todo, o desenvolvimento do setor e assim, buscaram aprimorar-se e em seus programas de gestão de operações mostrando a preocupação em estarem preparados para situações inesperadas.

Muitas companhias já certificadas, comprovaram o valor agregado de uma instalação com os princípios do Standard Operational Sustainability aplicados, tratados na certificação TCOS e sua operação certificada, trazendo para usuários e data centers a tranquilidade de enfrentar eventos e circunstâncias que poderiam ser um fator de risco, mas que puderam passar sem sentir os impactos das mudanças de rotina, por terem facilidade de reação e políticas bem estruturadas. Ao contrário, ter de desenvolver todo um processo desde o início, em meio ao enfrentamento de uma crise, é muito mais complexo do que já estar preparado para enfrentá-la.

Nestes tempos de “all remote”, onde a IoT é uma realidade ainda mais consolidada e a mobilidade demonstra que chegou para ficar e, o acesso às salas de reuniões e treinamentos virtuais exigem cada vez mais largura e velocidade das conexões de internet, a busca pelos especialistas de mais alto gabarito para cada etapa do processo de implantação de uma infraestrutura crítica de alta disponibilidade, acaba naturalmente convergindo para a demanda das certificações, já que a certificação está baseada no padrão Tier Standard Uptime Institute, globalmente reconhecido em termos de confiabilidade e desempenho de data centers. O mais importante é entender que a certificação vai muito além do que um selo, um carimbo, é um benefício comprovado de segurança e confiabilidade.

DCD: Na sua avaliação o país tem poucos data centers verdes?

E. G.: Acredito que tivemos um bom desenvolvimento das práticas de sustentabilidade, mas ainda estamos abaixo das expectativas. Valorizo isso e, como o Brasil é um país de muitos recursos naturais e ainda, como o data center é um dos maiores consumidores de energia e água, baseando sua operação no ar condicionado 24x7, sendo este de alto desempenho, a pegada sustentável deve ser um item importante na lista de prioridades das organizações nacionais.

Um bom trabalho, contudo, tenho visto por uma parte das empresas do segmento, que têm investido tempo de planejamento de projetos sustentáveis e que já têm colhido os frutos das medidas implantadas, frutos estes inclusive reduzindo consideravelmente os custos do seu consumo de energia e água e que vêm melhorando assustadoramente os seus resultados financeiros de bônus.

DCD: Do que efetivamente depende a eficiência operacional de um data center?

E. G.: Depende fortemente do controle e da medição minuciosa dos recursos e do consumo principalmente de energia e água, e a sustentabilidade ambiental está diretamente ligada como consequência positiva inerente à eficiência operacional, ou seja, com o aumento da criticidade das operações, tendo em vista as necessidades de demanda que enfrentamos nos últimos tempos, a curva prioritária mudou drasticamente e o núcleo executivo chegou a olhar mais de perto para a eficiência, o que traz um importante investimento na área de medição, controle, reutilização e economia de consumíveis e o uso de energias alternativas. Isso mostra que a rápida evolução de uma pegada sustentável se torna uma realidade antes utópica aqui, resultado de uma confiança daqueles que têm muitos recursos e trazem consigo a consciência da abundância: "não há razão para se preocupar".

O que se espera é exatamente que esse comportamento permaneça "verde" e nessa curva de evolução, até que todos ou, pelo menos, os data centers realizem esse controle eficiente de consumo, consequentemente ambiental, que atualmente não é comumente praticado em larga escala por organizações brasileiras e globais.

DCD: As empresas estão dispostas a investir em data centers verdes ou ainda encaram isso como um custo?

E. G.: Há uma disposição ainda tímida, mas a esperança está aí, antes nem mesmo ouvíamos falar no assunto, mas hoje vemos empresas de data center e, também empresas Enterprise que possuem grandes data centers, preocupadas e dispostas a investir em projetos verdes e soluções que tragam um pensamento ou um “perfil” de consumo verde para o dia a dia das operações. Um exemplo, é o início do interesse em buscar as melhores práticas para a otimização de uso de energia, tais como o Ambiente de Contratação Livre – chamado de Mercado Livre de Energia, onde é possível negociar energia elétrica livremente com os fornecedores, respeitando os órgãos reguladores, dando autonomia ao consumidor na gestão da energia elétrica, que passa a ser tratada como qualquer outro insumo produtivo, buscando assim a eficiência energética.

A concorrência no setor aumenta freneticamente, e isto tende a se manter crescendo devido ao “novo normal”, que foi criado pela demanda gerada pelo usuário doméstico de internet e, pelo corporativo, com as empresas que, antes utilizavam uma estrutura centralizada agora usa banda rápida, larga e pulverizada, com seus profissionais consumindo a partir de suas residências (home-office).

Assim, é fato que a administração dos recursos tem de acompanhar este patamar para que a companhia possa ser competitiva e se manter rentável operacionalmente, principalmente em seus custos Opex – (Operational Expenditure); e este controle trará em sua bagagem a necessidade de tratar com carinho os consumíveis mais caros desta história toda e que, são os principais impactantes para o meio ambiente, energia e água – o investimento no controle, medição e economia nestes recursos, melhoria na eficiência das máquinas, dentre outros tem sido sim, uma preocupação dos data centers certificados e há disposição para investimento.

DCD: Quais foram os impactos da pandemia de Covid 19 para o setor?

E. G.: Com a crise pandêmica de 2020, obviamente devido à necessidade de demanda, o crescimento avançou freneticamente e o Brasil se tornou líder no mercado LATAM.

Mesmo estando no topo da América Latina, o mercado de data centers do país ainda tem um caminho a percorrer quando se trata de "Sustentabilidade Operacional".

Não podemos pensar somente na maturidade construtiva, crescimento de capacidade de Colocation, metros quadrados, capacidade ou quantidade de salas de computadores. É importante dizer que esta maturidade deve estar acompanhada da maturidade operacional, sem a qual, podemos criar uma bolha de risco, difícil de administrar, depois de explodir.

Não adianta ter uma instalação maravilhosa e modernizada, gerenciada e operada por uma equipe despreparada porque o nível da equipe não atende ao nível da construção e para o propósito dela.

Nesse sentido, do ponto de vista operacional, acredito que uma parcela do mercado brasileiro precisa amadurecer e entender a importância de preocupar-se em preparar-se operacionalmente para operar com excelência para a nova demanda, muito mais exigente e, certificar que suas operações estarão preparadas para enfrentar novas crises.

DCD: Em relação a Europa e Estado Unidos, o que já vem sendo feito lá fora que é preciso ter aqui?

E. G.: Esses países têm sido mais rápidos em abraçar e monitorar os desenvolvimentos tecnológicos, não apenas no que diz respeito às máquinas, mas com a tecnologia de infraestrutura física embarcada em instalações elétricas, refrigeração, monitoramento e controle, etc., e também na gestão e organização de operações e manutenção de data centers. A automação, o uso de sistemas "robotizados", o treinamento online com plataformas inteligentes, a aplicação da ferramenta DCIM para controle de capacidades, cuidado com a contratação e treinamento de pessoal e políticas do site e assim por diante. Cada vez mais o mercado mundial tem sido modernizado na pós-inauguração.

No Uptime Institute costumamos enfatizar o conceito de "Pensando com o fim em Mente", ou seja, planejar como será a operação antes mesmo do início da construção, definir quem vai realizar cada tipo de atividade, como será o comissionamento, quem será responsável por cada etapa. Temos que adotar o "Planejamento" como objetivo e aprender a designar responsabilidades. Uma certificação de Sustentabilidade Operacional do Uptime Institute – Tier Certification of Operational Sustainability (TCOS), por exemplo, fornece uma ferramenta que permite ao proprietário ou operador do data center, determinar nas diversas áreas de atuação dentro da gestão de operações e manutenção, quais são as GAP's para alcançar o nível máximo de qualidade das operações sustentáveis, compatível com a infraestrutura instalada. Mas o que isso significa?

Isso significa que, precisamos estabelecer melhor uma preocupação sobre, não apenas a concepção, construção e entrega do espaço pronto para a instalação dos servidores, mas também, para entregar a certeza de que a operação está no nível compatível com a instalação, pois não adianta ter uma aeronave super moderna em mãos se, no comando desta aeronave, você não tem um piloto, copiloto e tripulação com experiência suficiente para manter esta máquina voando de forma confiável e segura. Este é um cuidado, que ainda é um déficit existente em muitas (não todas) das organizações nacionais, mas vem melhorando.