Há uma década que falamos da evolução e implementação do Edge. As previsões positivas, no entanto, se chocam com uma realidade que mostra um avanço muito mais lento do que o esperado da tecnologia no sul da Europa. Nos últimos anos, o Edge não necessariamente correspondeu às expectativas do setor, pois os casos de uso estão em constante evolução e as demandas estão em constante mudança.

Nesse ponto, por que o Edge não está atendendo às expectativas da indústria, qual é a trajetória de desenvolvimento dos Edge Data Centers no sul da Europa, se ele entregou os benefícios que prometeu e se o Edge morrerá, são algumas das principais preocupações levantadas.

Esse foi o tema do debate “Expectativas VS Realidade: Estamos estagnados no avanço dos Edge Data Centers no Sul da Europa?”, no Connect Madrid. Juan Carlos García, membro do Edge Cloud WG, European Alliance for Industrial Data, Edge and Cloud, participou do painel. Em entrevista antes do evento, ele falou sobre o assunto com a DCD.

Como acha que a implementação de Edge Data Centers está evoluindo no sul da Europa? Estamos avançando no ritmo que deveríamos?

Em primeiro lugar, é preciso entender de que tipo de Edge Data Center, ou nodo de computação Edge, estamos falando. De acordo com a taxonomia Edge definida pelo European Edge Observatory, existem vários tipos de nodos que vão desde o Metro Edge (ou “In-country Data Centers”, até 5 MW) passando pelo Medium Edge (Near Edge até 1 MW, Far Edge até 200 kW) até o On-premises (1-30 kW) e o Device Edge.

A Comissão Europeia estabeleceu a meta de atingir 10.000 nodos Edge sustentáveis e seguros (metro e médio) até 2030, dos quais cerca de 2.300 correspondem ao sul da Europa (Grécia, Itália, Portugal, Espanha, Chipre e Malta). Até o final de 2023, havia 176 nodos Edge naquela região, dos quais 45 foram construídos naquele ano. Isso significa que em 2023 estamos a pouco mais de 7% da meta de 2030. Ainda há muito a ser feito, especialmente considerando que muitos desses nodos são experimentais e apenas uma parte deles está realmente em produção.

Por que as previsões de progresso não correspondem e não caminham no mesmo ritmo da implementação real?

São vários fatores: a situação macroeconômica (altos níveis de inflação) e a situação geopolítica (guerras na Ucrânia e na Palestina) não ajudam. Há incerteza e isso não costuma ajudar a incentivar o investimento. Por outro lado, ainda há um longo caminho a percorrer na migração de aplicações para a nuvem pública. É difícil para uma empresa que não digitalizou e moveu boa parte de suas cargas de trabalho para a nuvem, ser incentivada a desenvolver e mover aplicações para o Edge. Grandes fornecedores de nuvem continuam investindo no negócio de grandes Data Centers porque é um campo que eles conhecem e dominam mais, e no qual ainda há um longo caminho a percorrer. Entrar na implementação de uma computação muito mais distribuída requer outro modelo operacional que exige maior esforço e incerteza pela necessidade de fechar acordos com parceiros locais e se ajustar às regulamentações locais, aspecto em que outros fornecedores, como as operadoras de telecomunicações, têm certa vantagem.

Há desenvolvimentos tecnológicos que ainda não foram concluídos, como os listados no Roteiro de Tecnologia Industrial da Aliança Europeia para Dados Industriais, Edge e Cloud, e que são necessários para permitir um serviço de Edge eficiente, competitivo e atraente. Estamos falando de automação, orquestração e mecanismos de federação de Edge que nos permitem construir o contínuo Edge e Cloud que a Europa procura, com base na federação de vários fornecedores.

É muito complicado oferecer um serviço de Edge regional e global sem a padronização do serviço (APIs) e a disponibilidade de mecanismos de coordenação entre fornecedores.

Por último, as instituições públicas devem estabelecer um quadro adequado, com políticas mais favoráveis e harmonização da regulamentação nos Estados-Membros da UE que deem maior confiança aos investidores.

Os Edge Data Centers estão entregando os benefícios prometidos?

Até agora, o negócio não cresceu como esperado, em grande parte pelas razões mencionadas acima, mas o valor de sua implementação no Edge para alguns casos de uso foi amplamente demonstrado. Essa fase foi superada, já sabemos o que ela pode trazer para a computação em nuvem clássica. Agora é a hora de quebrar o ciclo vicioso de esperar por uma “aplicação espetacular” para implementação de infraestrutura e esperar pela disponibilidade da infraestrutura para o desenvolvimento maciço de aplicações Edge. Iniciativas como o IPCEI-CIS europeu visam impulsionar uma implementação inicial de infraestrutura e a disponibilidade de componentes tecnológicos para iniciar o desenvolvimento de aplicações de maior escala no Edge.

Há quem diga que o Edge está morto, concorda ou discorda dessa afirmação?

Prefiro dizer que o Edge está nascendo. Passamos anos desenvolvendo tecnologia e aplicações para tornar isso possível e desenhando estratégias de implementação. Agora é uma questão de tempo para acelerar os investimentos, e vemos os primeiros aparecerem na Ásia, nos EUA e um grande impulso da Comissão Europeia sobre isso com o lançamento, no final do ano passado, do IPCEI-CIS, o importante projeto de interesse europeu comum para a nova geração de Edge e cloud europeus, que inclui investimentos públicos e privados de 2,6 bilhões de euros (14,6 bilhões de reais). Isso dará o impulso necessário para concluir os desenvolvimentos pendentes e realizar as primeiras implementações industriais na Europa. O projeto envolve 12 Estados-membros e mais de 100 empresas, dando nova vida ao desenvolvimento do Edge.